PAULO AFONSO – Empresário, advogado e ex-presidente do PSDB, Adelmar Martorelli, diverge de um pensamento que se tornou trivial, após o resultado das urnas em novembro ter sugerido o fim de uma era e o começo de um ciclo novo na política pauloafonsina, encarnado na figura do jovem e ex-vereador Mário Galinho (Solidariedade), e de seu candidato a vice-prefeito, Luiz Neto, barrados da prefeitura por 805 votos.
Martorelli sugere precipitação e falta de lógica em quem aposta num eventual abalo da hegemonia do grupo liderado por Luiz de Deus (PSD), prefeito reeleito. Porém, avaliando quem poderia levar adiante o legado, no que diz respeito à família, não vê ainda em Luiza de Deus, neta do prefeito, as condições necessárias para bom uso da herança política, “falta muito a ela ainda”, comentou.
O advogado, antes como presidente do PSDB, participou de dois pleitos na coalização com Sônia Caires (PSB/2012), e depois, com Paulo de Deus (MDB/2016), ambas as campanhas, perdidas para o grupo de Anilton Bastos (Podemos).
A conversa com o Painel foi em seu escritório. Acompanhe:
Existe alguma vantagem em apenas “assistir” à eleição, como o senhor optou agora em 2020, para um militante?
A vantagem está em apenas observar de longe. A vista de quem está de fora é mais privilegiada e você consegue ver as inconsistências, e as inverdades propagadas pelos políticos, infelizmente. Você consegue ter mais discernimento não se envolvendo emocionalmente, evita a temperatura da movimentação política.
Mas não é justamente “esse calor” que faz a pessoa abandonar tudo e se contaminar, como lhe ocorreu em 2016, o que aconteceu que o senhor não quis mais?
Porque em 2016 eu estava motivado, mas agora eu fiquei menos esperançoso. Digamos que eu fiquei quatro anos mais desiludido.
Mas foi uma eleição diferente e quente nas redes sociais, e o resultado surpreendeu muita gente. Qual é sua leitura do processo?
De fato houve esse engajamento das pessoas pelas redes sociais, mas fatalmente chegaria aqui; começou no mundo lá atrás com Obama [ex-presidente dos Estados Unidos], depois Bolsonaro e ganhou o interior do Brasil como Paulo Afonso, não sei medir a intensidade em cidades menores como Jatobá e Petrolândia, por exemplo, mas aqui foi forte. Com relação à eleição de Luiz de Deus, ficou comprovado que a cidade continua um ‘curral eleitoral dos deuses’; tivemos apenas uma candidatura de oposição que foi muito bem, bateu na trave – Anilton não se pode considerar oposição porque é cria dos deuses-, mas é preciso analisar as coisas como são, não adianta dourar a pílula, não houvesse a cisão entre Luiz e Anilton, o resultado não seria de 805 votos contra Galinho, mas de mais de 12 mil votos. Galinho está de parabéns, mas sem o rompimento o ex-vereador não teria passado perto de se eleger. Eles ainda são hegemônicos.
Forçadamente criou-se três grupos políticos, Luiz, Anilton e Mário, como os antagonistas podem permanecer competitivos frente aos deuses?
Vai depender muito da cabeça e inteligência política que Mário tiver. E sobretudo até que ponto essa briga entre Anilton e Luiz vai. Percebemos que foi sério, mas a briga entre Luiz e Paulo não foi desprezível em 2016, após as eleições saíram abraçados.
O senhor sugere que Luiz e Anilton podem voltar a ser aliados depois de tudo?
Como diz o velho dito espanhol no creo en brujas, pero que las hay, las hay, ou seja, convém não duvidar de nada. Anilton não se deu muito bem com a separação de Luiz, não foi legal para ele, mas Anilton não é um sujeito humilde que vá reconhecer isso.
Luiz de Deus agora tem o PP.
É gente demais para pouco espaço. Anilton e Luiz são parceiros há mais de 30 anos, Mário Júnior está chegando agora. É difícil você renegar a história, você não abrir a porta para um parceiro de 30 anos.
Luiz Neto disse que “a cidade não quer mais”, independente da configuração que os deuses tragam.
Não se sabe de onde Luiz Neto tirou essa conclusão, mas eu respeito.
Da urna!
Mas as urnas disseram exatamente o contrário. A urna disse que a diferença de votos, somando Anilton e Luiz, foi de quase 13 mil. Não estou tirando a excepcionalidade da campanha de Mário e Neto, mas analisando friamente os números o resultado não foi esse.
Os deuses, gostem ou não, vão para a quarta gestão consecutiva.
O grande problema é exatamente a falta de alternância política. Para o bem da cidade o interessante seria um giro no poder. Assim eu espero que ocorra, não sei se virá em quatro anos. Paulo Afonso já deveria estar pronta para mudar.
A oposição pode sofrer revés também nas ruas, 2020 teve Covid, e nem sempre o clima de mudança permanece, qual é o caminho?
A oposição precisa ser séria e propor. Eu não vi propostas de Galinho. Eu o entrevistei [na Rádio Angiquinho] fiz algumas perguntas no sentido de plano de gestão, e a resposta dele “foi que estava muito cedo para tratar daquilo naquele momento”, sinceramente achei que ele não tinha propostas, não saberia o que fazer. Faltou preparo.
Há um ranço forte contra os deuses, o senhor acha que o grupo não foi bom para Paulo Afonso?
Pelo contrário, não disse isso, mas o poder vicia. Por estar há muito tempo no poder, a cidade é como se fosse um apêndice, uma extensão da casa deles. Não estou falando de malversação de recursos, mas de uma certa acomodação, por isso a alternância é fundamental, só faria bem a Paulo Afonso. É importante que eles saiam, e se tiverem que voltar, venham com alguém da nova geração. Que tenha a importância que Luiz de Deus teve no passado, cometeu erros e acertos, mas na última década vem acumulando um erro atrás do outro.
O senhor volta à política?
Não tenho mais vontade. Meu passa tempo é reclamar deles, criticá-los, é minha diversão e ao mesmo tempo um serviço que eu posso prestar pela minha cidade.